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terça-feira, 22 de maio de 2012

129 - Do Largo de Mompilher até ao Mirante, pela Rua do Pinheiro

Uma amiga portuense desde há uns tempos que me perguntava para quando fotos e histórias sobre a Rua do Pinheiro.
Pois bem, chegou agora a vez de mostrar e escrever sobre esta artéria que tem muitas e belas histórias.  Que vou estender até ao Mirante, para sul, a uma centena de metros.
Antes de subirmos as Escadas do Pinheiro, encontramos o Largo de Mompilher, nome aportuguesado da Universidade francesa de Montpellier, muito ligada à cultura nacional na idade média e no renascimento. Lê-se isto mesmo (embora esteja escrito Montpelier) na toponímia da Câmara Municipal do Porto. Sem dúvida uma das mais antigas Universidades do Mundo, fundada em 1220.
O Quiosque no Largo está classificado como Imóvel de Interesse Municipal. Nas últimas décadas do séc. XIX e princípios do XX, estas estruturas arquitectónicas - hoje chamar-lhe-iam equipamentos urbanos - foram crescendo pela cidade e eram ponto de encontro de artistas, escritores, aristocratas. A função comercial era a venda de bebidas, flores, frutas. Não sei se ainda algum estará a ser explorado, mas lembro-me de nestes quiosques se venderem jornais, revistas, tabaco, artigos de papelaria. Há meia dúzia de anos este ainda funcionava,
Foi construído nos anos 30 tendo substituído um em ferro que existia desde 1910.

Mas o Largo teve outros nomes. Chamou-se da Conceição (ou Senhora da Conceição) sendo substituído posteriormente pelo da Picaria. Rua da Picaria que se vê na imagem, descendo até à Praça Filipa de Lencastre. Mas essa descoberta fica para a próxima viagem.

Então subimos os dois lanços das Escadas do Pinheiro, projectadas em 30 de Janeiro de 1775, para encontrar a Rua com mesmo nome. Na altura chamava-se Rua da Misericórdia. À esquerda ficam as instalações de um serviço de apoio aos Imigrantes e à direita a setecentista Capela do Pinheiro ou da Senhora da Conceição.

A Capela deveria ter feito parte de uma propriedade adoçada a uma casa. A casa actual deve ser relativamente recente. Segundo a minha amiga antes referida, o seu proprietário era um tal Lencastre.
No entanto a história do lugar é muito antiga.
Em 1508, João Rodrigues de Avelar e sua mulher Grácia Luís, venderam o seu campo no Casal do Pinheiro «junto aos Carvalhos do Monte, prez da cidade» e um par da estrada pública. Em 1533, nova venda do « Lugar ou Casal do Pinheiro, situado entre a estrada que vem de Guimarães (actual Rua Mártires da Liberdade) para a Porta do Olival (actual Cordoaria) e o caminho de Liceiras (ainda existe a Rua de Liceiras, junto à Trindade, cerca de duas centenas de metros a baixo). Tinha então esta propriedade um pombal e várias árvores de fruto, entre as quais se mencionam laranjeiras que mais tarde, com outras por ali existentes, dariam ao Casal do Pinheiro o nome de Quinta do Laranjal de Cima, que já tinha em 1661. A Quinta do Pinheiro foi alienada há poucos anos pelos últimos sucessores dos Monteiros, na posse desta bela propriedade desde princípios do século XVIII. (Copiado da toponímia da Cidade, Toponímia Portuense de Andrea da Cunha e Freitas).
O antigo Bairro do Laranjal era extenso. Incluía toda a zona desde a Trindade até às Cardosas. 

Para esta Quinta do Pinheiro foi transferido o Instituto Escolar de S. Domingos que presumo ter existido antes na Rua da Sovela, actual dos Mártires da Liberdade. Deve ter sido por volta de 1880. Tomou o nome de Escola Académica do Porto. Gente ilustre aqui estudou, destacando-se António da Rocha Peixoto (1866-1909), Naturalista, Etnógrafo, Arqueólogo, Bibliotecário. A sua biografia pode ser consultada em http://sigarra.up.pt/up/WEB_BASE.GERA_PAGINA?P_pagina=1004207
Por volta de 1975 no mesmo edifício foi criada uma Comissão de Moradores da ex-Escola Académica, com ATL, Jardim de Infância e Lar de 3ª Idade. Em 2008 receberam ordem de despejo e em 2009 despediram os 20 trabalhadores. Presumo que o dono da propriedade é o Montepio Geral.
Actualmente encontra-se tudo vedado e sujo. Gatos também não faltam. A foto possível foi feita atravez da rede.
Consta-se que estava projectado um estudo urbanístico para a zona.
A Câmara Municipal vista do adro da Capela e que terá sido um Miradouro em outros tempos.

Tomamos então a Rua do Pinheiro. Muitas casas da Rua foram recuperadas e existe numa delas um espécie de Hostel - parece que é assim que agora se chamam às Casas de apartamentos de aluguer temporário -.
No princípio da rua ainda há algumas em ruínas. Curiosamente foi numa delas que viveu a minha amiga parte da sua infância e juventude. Na outra viveu também Ruth Escobar.
Maria Ruth dos Santos, mais conhecida como Ruth Escobar, nasceu no Porto em 1936. Mudou-se para o Brasil em 1951, onde casou com o filósofo e dramaturgo Carlos Henrique Escobar. Em 1958 partiram para França onde Ruth estudou arte de interpretação. Regressada ao Brasil, criou a sua própria companhia. Tornou-se uma das mais importantes produtoras do Brasil e atriz de grande mérito. Nos anos 80 veio a Portugal e ao Porto onde se apresentou no Teatro Rivoli. Voltou-se para a política, foi eleita deputada estadual para duas legislaturas, (presumo que por S. Paulo) tendo-se dedicado a projectos comunitários. Fundou o seu próprio teatro, actualmente em ruínas. Sofreu a perseguição da censura brasileira.
(texto copiado de http://spescoladeteatro.org.br/noticias/ver.php?id=1977 
Muitas outras páginas se encontram na net dedicadas à Ruth
Ruth que se encontra muito doente desde há uma dezena de anos.

Pormenores da Rua do Pinheiro. Em baixo e à esquerda, a velhinha "Oliveira Encadernadores", tipografia e encadernação de livros. Fui lá algumas vezes a mando dos meus primeiros patrões, levar obras para encadernar. Segundo me pareceu, na altura, eram velhos "compinchas de tainas" desde a juventude, o Sr. Monteiro e o Sr. Oliveira. Quem esteve ligado às artes gráficas (hoje, indústria) ainda deixa muitas saúdades sentir o cheiro das tintas, mesmo que de leve...
Tanto quanto me apercebi, esta rua foi verdadeiramente democrática. Trabalhadores braçais, capitalistas, militar graduado, renegado político morto no Tarrafal, todos aqui conviveram. Era uma rua como tantas outras, pequenas, da cidade esquecida, onde todos se conheciam, cumprimentavam, partilhavam.
A Rua termina na dos Mártires da Liberdade e nesta começa a Travessa do Coronel Pacheco que por sua vez vai dar ao Largo do mesmo nome. Na esquina do lado esquerdo, um antiquário e alfarrabista com belas obras em exposição, num lindo edifício recuperado.

No outro lado, na esquina da Rua do Pinheiro com Mártires da Liberdade, outro belo edifício com as fachadas cobertas a azulejos.
Aliás, belos edifícios não faltam neste perímetro. Ocupando quási todo o lado direito da Travessa, outro lindíssimo edifício cuja fachada principal é digna de ser apreciada. Infelizmente não consegui encontrar quaiquer referencias sobre as suas origens.
Nos anos da descolonização de África, serviu para alojar alguns dos chamados retornados até conseguirem encontrar a sua nova vida. Foi pensão de aluguer de quartos baratos, degradou-se mas foi recuperado recentemente, sendo agora um Hotel-Residencial de boa qualidade.

Olhemos agora em volta da Praça do Coronel Pacheco. Da esquerda para a direita, de cima para baixo, seguindo as fotos. Isto é de Leste até ao Norte. Um correr dos tais belos edifícios que por aqui se encontram. Nos rés-do-chão, vários comércios, incluindo uma alfaitaria à moda antiga. Seguindo, dois palacetes, um de cada lado da Rua do Mirante. O da esquerda abriga a Escola Contemporânea do Espectáculo - A.C.E ; O da direita, um núcleo não sei de que Faculdade (a placa à entrada está partida) da Universidade do Porto. Do outro lado, isto é, para oeste, já lá iremos em pormenor. Rodando de novo, definitivamente, entre dois novos edifícios, um deles Hotel, encontramos a velha esquadra da Polícia.
Mas agora vamos à história deste Largo que evoca a memória do Coronel Pacheco. Comecemos pelo fim. O Liberal Coronel José Joaquim Pacheco foi comandante do Regimento de Infantaria 10 e morreu em 2 de Dezembro de 1833 na Areosa (local limite da Cidade do Porto para Norte, confontando com Rio Tinto. Aqui termina a Rua de Costa Cabral que vem da Praça Marquês de Pombal, ou antigo Largo da Aguardente. Isto é "canja" para os portuenses, mas devo estas explicações aos meus leitores) enfrentando as tropas absolutistas de D. Miguel durante o terrível Cerco do Porto. E assim o Largo passou a ter esta toponímica por decisão camarâria de 28 de Outubro de 1835.
Antes chamava-se Largo do Mirante. Bem como a Rua voltada a sul e que daqui sai até à de Cedofeita e ainda mantém o mesmo nome.

Pois neste Largo foi a Feira do Carvão e toponìmicamente falando, o Largo do Mirante. O seu nome deriva de uma Quinta que aqui existia propriedade de António Ribeiro Braga (que também deu o nome à Rua dos Bragas. Anteriormente já me referi à família quando escrevi sobre a Rua de Cedofeita). Um mirante existiria onde hoje está a rua que conserva este nome. Mas a toponímia Largo do Mirante já vem referenciada desde cerca 1760  figurando na planta do Bairro dos Laranjais.
No cimo do portão que dava acesso à quinta podem ver-se as iniciais ARB. Este pormenor foi-me revelado num escrito do Historiador e Jornalista Germano Silva. Será verdade que é o portão original ?

Passando o portão do edifício que será mais um polo (sou eu a imaginar) da Universidade do Porto, este das Ciencias da Comunicação, ao fundo estão as traseiras da primitiva Faculdade de Engenharia. O imóvel foi construído entre 1927 e 1937 com as frentes para a Rua dos Bragas. Ràpidamente se tornaram as instalações insuficientes. Mas só em 2000 o novo polo na Asprela entrou em funcionamento. O edifício foi recuperado para a Faculdade de Direito, inaugurado em 22 de Março de 2004.
Mas vale a pena copiar na íntrega este escrito:  Os terrenos onde se rasgou esta Rua dos Bragas pertenciam a um casal rústico , chamado dos Carvalhos do Monte (…) à beira da estrada de Braga. (ou de Guimarães, nota minha, e que é a actual Rua dos Mártires da Liberdade)  Este casal veio por herança, à posse da família Ribeiro Braga [e] incorporou-se na Quinta do Mirante (…). Foram estes proprietários que deram o seu apelido à Rua dos Bragas." [Freitas, Eugénio Andrea da Cunha e – Toponímia Portuense. Matosinhos: Contemporânea Editora. [1999]. ISBN 972-8305-67-2].
http://sigarra.up.pt/up/web_base.gera_pagina?p_pagina=1006597
Quando as tropas Miguelistas cercaram a cidade, a casa da Quinta do Mirante foi ocupada pelo exército Liberal que nela instalou o Regimento de Infantaria 10. O tal que era comandado pelo Coronel Pacheco.

No mesmo correr a oeste, situa-se a Igreja do Mirante, o templo protestante mais antigo da cidade que se reveste de uma grande importância para os Metodistas por ser a sede nacional da Igreja Evangélica Metodista.
Diz-se que os primeiros metodistas em Portugal foram os soldados ingleses que nos ajudaram na luta contra os franceses durante as Invasões (1807/1812)
O edifício começou a ser construído em 1860 e a Igreja inaugurada em 25 de Março de 1877.
Parece que foi construído apenas por estrangeiros, visto que os portugueses não podiam abrir nenhuma igreja que não fosse Católica. http://jpn.icicom.up.pt/2009/01/07/religioes_no_porto_igreja_do_mirante_e_o_templo_protestante_mais_antigo_da_cidade.html

Seguindo por esse passo entramos na Travessa de S. Carlos, cuja origem toponímica desconheço. Mais alguns belos edifícios, onde predomina a pedra na sua construção e o ferro das varandas.
Vai esta Travessa dar à Rua dos Mártires da Liberdade. Com pena e nostalgia olho a sede do que foi uma das grandes empresas ligadas às artes gráficas, o Polónio Basto.
Recordo alguns escritos de amigos, dando-me a conhecer a sua vivência de jovens trabalhadores na zona de Mártires da Liberdade.  Pois aqui vai a foto da Casa Bento, onde um deles iniciou a sua vida de trabalho.
Voltando atrás vemos todo o pormenor da zona leste do Largo do Coronel Pacheco.
Terminamos este roteiro junto à Rua do General Silveira. Por aqui começaremos um novo, em próxima publicação.
Mas fixemos mais um belo edifício, em cuja loja, se a memória não me atraiçoa, exixtiu uma padaria.

quarta-feira, 16 de maio de 2012

128 - Gabinete de Numismática

É um dos Núcleos Muselógicos do Museu da Cidade do Porto. Este, em si, não existe. Foi uma ideia de Manuela Melo, vereadora da Câmara do Porto, que nunca foi avante. Por falta de verbas ou por outras coisitas. Ficamos assim com vários Núcleos Museológicos.
Instalado no Palacete dos Viscondes de Balsemão, em Carlos Alberto, desde 2009, vindo da Casa Tait onde esteve desde Dezembro de 1988.
É uma colecção iniciada em 1850, depois de  adquirida a colecção particular de João Allen (1781-1848).  Esteve no chamado Museu Municipal do Porto, (inaugurado em 1852) na Rua da Restauração, na casa de Allen, comprada pela Câmara bem como o espólio do coleccionador.
Transferido para o depósito da Biblioteca Municipal do Porto em 1905 permaneceu aí até 1937, seguindo depois para o Museu Nacional Soares dos Reis por decreto do governo desse ano, sendo o Museu inaugurado em 1942. Retornou à posse da Câmara em 1988.
Conta actualmente com uma das maiores colecções de numismática de Portugal, representando um papel fundamental no estudo da numária grega, romana, hispânica, árabe e portuguesa.
Estão representadas moedas das várias emissões efectuadas ao longo dos séculos não só para os territórios africanos, como também para o Brasil, Timor, Açores e Madeira.
Conhecemos também a história das várias Casas da Moeda do País.
As colecções integram moedas, medalhas, condecorações, apólices, cédulas, notas bancárias, cunhos de medalhas e chapas de impressão de notas bancárias.  
A figura de um cunhador de moedas está também representada.

127 - O Aljube e Exposições

Sou um visitante relativamente assíduo do Edifício do antigo Tribunal da Relação e do Aljube do Porto, na Cordoaria, e actual sede do Centro Português de Fotografia.
Uma das razões que lá me levam, são as exposições que periodicamente exibem. Para além do Museu e a exposição permanente sobre a Fotografia e a relação com os detidos.
De entre as quatro exposições que estavam em exibição no dia da minha última visita (uma delas já terminou) destaco duas:

 Uma, sobre as Mulheres de Camilo, aberta até 24 de Junho.
Opções de vida e obra do grande autor, discutíveis mas sempre assumidas.
Foi neste edifício, na cela S. João, que Camilo esteve preso devido aos seus amores "ilícitos" com Ana Plácido, sendo ela também aqui prisioneira. Na exposição, pode-se ver a capa da primeira edição do Amor de Perdição, escrito na sua cela.
A exposição retrata as nove mulheres que mais marcaram a personalidade de Camilo, lê-se no folheto distribuído.

Mas o mote é Ana Plácido, a mulher que mais tempo passou junto a Camilo e que reuniu o que todas as outras foram para ele.
 Sua mãe, também lembrada, que o deixou órfão muito cedo.
Texto do folheto é da autoria de Maria de Lourdes Ferraz in Mulheres de Camilo.

A outra exposição tem o título E Ainda Vejo os Seus Rostos, Fotografias de Judeus Polacos.
Está aberta até 3 de Junho.
É uma exposição itinerante vista em várias Cidades do Mundo.
Tudo começou com um apelo de Golda Tencer em 1994, (actriz, directora da Fundação Shalon, nasceu em Lodz, na Polónia.) - ( esta parte é de minha iniciativa. Se estiver errado é defeito da compreensão da tradução) - pedindo fotos de judeus polacos. Chegadas não só da Polónia mas de todo o Mundo, foram já mais de 9.000  as fotos recebidas.










As Enxovias à volta do Pátio dos Presos acolhe esta magnífica exposição fotográfica. Legendada em Português e Espanhol. Inclui uma passagem de slides e musica de autores Judeus. Não sei se Polacos.

Para além das Exposições e do Museu da Fotografia (fabuloso), recomendo uma visita a este edifício. Podem ler alguns pormenores no meu escrito nº 69.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

126 - Campanhã. A Oriente do Porto. 2ª Etapa

Resolvi fazer um passeio tentando ligar por uma dura (soube-o depois)  mas bela caminhada, alguns lugares do último roteiro ( Post 125) sobre Campanhã saindo agora desde o Alto do Soutelo, no entrocamento de Rio Tinto e Fanzeres. No sentido do Lugar das Areias. Se o anterior começou de Sul para Norte, este é o contrário.  
Uma grande parte do percurso, talvez uns 2 km e pouco, foram feitos por zonas habituacionais. No entanto, para o lado esquerdo que deve pertencer a Fânzeres, por entre algumas residencias, vêm-se belas matas e no seu interior umas hortas bem aproveitadas. 
O progresso trouxe as auto-estradas que no Lugar das Areias alteraram toda a zona. Aqui é mais uma divisória entre o Porto e Gondomar. Agora há a Rua, Travessa, Rua Nova, Largo das Areias. Mas não descobri o porquê deste topónimo.

Passando a Ponte que atravessa as auto-estradas, encontramos à esquerda, um pouco à frente, o Horto Municipal do Porto. Dizem - ou escrevem - que é o maior e mais belo do País. Não sei se é visitável, mas hei-de saber.
Diz-se também que está localizado na antiga Quinta das Areias, no Lugar de Azevedo, em Campanhã. Foi uma antiga quinta com capela que remonta ao séc. XVIII, com uma áre de aproximadamente 67000 m2, tendo sido adquirida pela Câmara Municipal do Porto em 1937 para instalar o Horto.

Do outro lado da rua, olhamos uma bela panorâmica por toda a parte Norte de Campanhã e Bonfim, com a Bela Vista e Antas ao alto. Corujeira e S. Roque da Lameira em baixo. Mas há muito mais para deliciar a vista para além do que a pequena imagem mostra.

Um desvio pela esquerda para entrar num caminho que pomposamente se chama Rua de Furamontes.
Parece que a actual Quinta das Areias, ou pelo menos uma parte, seria a primitiva Quinta de Furamontes.
Este topónimo provàvelmente teve origem na alcunha de um morador ou proprietário local.

É de 1608 a primeira referência ao local, o que não quer dizer segundo a Câmara Municipal do Porto, que não seja anterior. Em 1601, um assento de óbito de Campanhã menciona a aldeia de Fial, que em 1632 se diz Fial Maior, Faial em 1653 e Feal em 1664. Este lugar identifica-se com o de Furamontes; lemos em registos paroquiais de 1724, Fial de Furamontes e em 1735 Fial ou Furamontes...( Toponímia Portuense de Andrea da Cunha e Freitas ) no site da Câmara.
Há Furamontes por Ferramontes (paralelismo com minas de ferro) nos Registos Paroquiais de Campanhã.

Sem ver viv'alma lá fui prosseguindo o caminho por entre muros e mata, sem fazer ideia onde me encontrava. E a orientação pelo mapa da Cidade oferecido aos "turistas" não ajuda nada, porque os lugares do extremo oriental nem referenciados estão.
Caminhando por caminhos de pé posto, vão aparecendo encruzilhadas, com muros altos ou mata. Com palpite, meter numa encruzilhada à direita e encontra-se o Calvário. Lugar que foi muito antigo e ainda assim se chama, isso sei, mas agora com Rua, Travessa e creio que Largo.
Em tempos de afirmação religiosa, era fundamental a cristianisação de lugares de passagem, de caminhos mais concorridos, de encruzilhadas, de pontos altos. Em 1758 eram 5 as vias sacras que percorriam a Freguesia de Campanhã. 70 ou 80 cruzes que denotavam o fervor católico. De entre elas, ...uma que vinha da Capela de Nossa Senhora do Pilar (referi a existência de uma antiga capela na Quinta das Areias, que terá sido de Furamontes) do Cazal de Furamontes ao Monte de Azevedo. ...Todos os lugares com cruzes de pedra bem lavradas... Presumo então que para chegar ao Monte de Azevedo, seria pelo Calvário a sua passagem, de quem vem das Areias, como eu vim.
Passa-se ainda pelo Lugar da Aldeia, sempre por ruas estreitas, mas sem nada de especial a referir segundo uns moradores. E encontramos o alto de Azevedo anteriomente percorrido em parte.
Para a direita é o Parque Oriental, onde várias ruas lá vão dar, mas passando pelo Bairro do Lagarteiro. É complicada a passagem pelo Bairro apenas por causa dos arruamentos e escadas que é preciso descer.
Descansei um pouco, vendo uma peladinha, num recinto bem tratado.

Por indicação precisa de umas moradoras, caminha-se entre um Bloco residencial e a mata, atravessa-se uma vala e entramos no novo arruamento, que até são dois, que passa pelo Parque e vem desde o Lagarteiro acabando na nova IC29. Ou N12, não sei. Tudo isto porque queria ir para Norte e talvez uns 6 km tivessem sido percorridos, uma boa parte por caminhos que sabe-se lá porquê se chamam de ruas. Mas queria conhecer como é o Pêgo Negro actual.
Mas valeu a pena subir mais um "pouco" e apreciar o Parque cá do alto.

O Ribeiro chamado de Rio Tinto, nasce salvo erro em Ermesinde, atravessa a Cidade que deriva do seu nome (em tempos remotos uma grande parte dela pertenceu a Campanhã) e passa ao lado do Parque a caminho de sua foz no Esteio de Campanhã, juntando-se por essa altura ao Rio Torto.

Chega-se a Pêgo Negro por baixo da auto-estrada, a tal IC29 ou N12. É uma longa artéria, chamada de Rua, que vem desde a Circunvalação, atravessa o Rio Tinto, num sobe e desce constante. Continua a Norte do Parque Oriental e lá vai a caminho das Areias, junto ao Horto.
Conseguimos uma vista deslumbrante sobre o vale com o Parque, floresta, mata e hortas atravessadas pelo Rio, sobre o qual há algumas pontes. Uma em ruínas junto ao que presumo serem também ruínas de um moinho. Outras "inventadas" pelos hortelãos.
Caminhe-se então pelo Pêgo Negro. Um amigo que em tempos me escreveu sobre ele (ou ela, Rua) , talvez se lembre ainda desta zona.
Imagens antes e depois de atravessar o Rio. Uma ou outra ruina de velhos moínhos ainda se vêm. Na toponímia da Câmara Municipal, lê-se que a mais antiga referência que se conhece ao Pêgo Negro é de 1591, num registo de óbito da Freguesia de Campanhã. Outra referência é de 1785 como Ribeiro do Pêgo Negro.
Não me lembro se era em Pêgo Negro, ou mais abaixo no Lagarteiro, que existia uma tasquinha, presumo reconstruída numa velha casa com moínho, dada a conhecer por meu Pai. Tinha uma bela ramada no verão, junto ao Rio Tinto, onde se comia um saboroso bacalhau assado na brasa acompanhado de uma não menos excelente "broa". O vinho era o tradiccional "americano" de sabor e cheiro gostosíssimo, cuja venda ainda hoje é proíbida. O segredo do bacalhau estava no Rio, pois era onde o demolhavam na levada que ali fazia,  dentro de sacos de sarapilheira.

Chegamos à Circunvalação, uma extensa cinta que envolve toda a Cidade desde o Freixo, junto ao Esteio de Campanha, até ao Castelo do Queijo, num perímetro aproximado de 30 km. Estabeleceram-se barreiras ao longo dela para a cobrança de impostos sobre as mercadorias entradas na Cidade, autorizados por Carta de Lei de 25 de Fevereiro de 1861. Numa extensão de cerca de 16,5 km construíram-se fossos, cavados em volta da Cidade para dificultar o contrabando. Ficou totalmente pronta em 1897. Aquele imposto foi abolido em 1943, desaparecendo as barreiras.
Lembro-me ainda de se chamarem Barreiras a alguns pontos da Circunvalação, fronteiros com as localidades vizinhas, como por exemplo o do Freixo, de Rio Tinto junto à ponte, da Areosa. Aí se encontravam enormes balanças para pesagem de camiões. Junto à Ponte Luíz I, mas do lado de Gaia, ainda lá se encontra uma. Nesses pontos, encontravam-se postos da Guarda Republicana.

Por estes lados existe outro lugar, conhecido como Tirares. Cujo origem pode ter sido a cidade fenícia de Tiro, na Líbia, junto ao Mar Mediterrâneo a cerca de 30 Km de Sidon. Hoje chama-se Sur.
É Rua e Travessa e vem do Lagarteiro até ao lugar dos Moinhos, na Circunvalação. O nome pode ser corrompido de Tiraz, de uma Azenha com esse nome, que em 1422 pertencia a uma dama portuense sendo o Cabido o senhorio.
Santa Rosa de Viterbo (Viterbo, Itália, 1233-1252) ensina que Tiraz era uma espécie de pano de linho com ramos e feitios, que se usava como talagarça. (Pano grosso e ralo onde se borda).
Mas também pode ser lugar ou fábrica onde se manufacturavam famosos tecidos, bordados e tapetes que o luxo dos sarracenos exigia. Muito usual no Centro-Sul de Portugal, principalmente em Arraiolos e daí talvez venha a fama dos seus tapetes.
E prontos, acabei e logo com umas derivações que parecem nada a ter com o meu passeio. Não será bem assim, porque tudo tem uma origem. E Campanhã tem origens bem antigas, pelo menos desde o período megalítico. E como por cá andaram Suevos, Fenícios, Gregos, Cartagineses, Romanos, Muçulmanos, Judeus, Arménios, - a ordem é arbitrária - não falando já dos famosos Lusitanos que depois "deram" com Celtas e Iberos os Celtiberos, com origem no séc. VI antes de Cristo e reconhecida por Plínio, o Velho, -que morreu em Pompeia durante a erupção do Vesúvio  - umas centurias mais tarde.