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segunda-feira, 30 de abril de 2012

125 - Campanhã - A Oriente do Porto

Campanhã é a maior Freguesia da Cidade do Porto. E julgava eu que era Paranhos. Mas a culpa é dos sites das Juntas onde se lêm estas coisas. Portanto será esta a terceira maior freguesia do País e não Paranhos. De qualquer forma fui freguês nas duas. Também o fui de Massarelos, mas pelo acidente que foi o meu nascimento.
A primeira referencia a Campanhã é num documento de 994. A origem da palavra será sueva, derivando depois para o latim e muito mais tarde para a forma actual.
Este percurso que relato e mostro aconteceu por casualidade. Tem tanto de curiosidade como de sentimental. Lá irei chegando aos poucos.
Tive de ir à Junta e ao Cemitério de Campanhã há dias e aproveitei para perguntar onde ficava a Capela do Forte. Devo dizer que desconhecia quási totalmente esta parte da Freguesia, salvo uma ou outra passagem em transporte público.
Localizada a Capela, no dia seguinte fiz um convite ao meu amigo e caminheiro Peixoto para descobrirmos mais um percurso dentro da nossa Cidade.

Nos preliminares, uma pequena história sobre a Igreja de Santa Maria de Campanhã, também conhecida pelo título de Senhora da Entrega, pois os devotos lhe ofereciam as suas orações e não só, em troca das chuvas (ou do seu fim), da saúde, das colheitas. Tudo começa após a tomada aos Mouros pelos Cristãos por volta do ano de 750, do Lugar e depois a Cidade do Porto, que havia sido perdida por D. Rodrigo, o último rei dos Godos. É uma história linda que envolve a Andaluzia no sul da actual Espanha de hoje.
Segundo a lenda foi encontrada uma imagem de Nossa Senhora, presumo que nos terrenos da Quinta da China, que ainda existe hoje, embora e lògicamente com menos território. Transcrevo copiando como li no texto referente à imagem: "...foi achada a Imagem da Senhora, que he de pedra, e tem o menino nos braços, terá pouco mais, ou menos coatro palmos, e meyo de alto. He lavrada com todo o primor da ane (?), com roupas do mesmo material..." e continuando mais à frente, ...   
anno de Christo de 714, seria a restauração da Cidade do Porto, e achada esta milagrosa Imagem dispois da batalha, e victoria, nos antros do Senhor de 750; attendendo a que D. Affonço Reynou IS (?). antros, e se hleceo no anno de 759; e ha hoje 1008 annos com pouca differença, que foi achada a milagroza Imagem de Nossa Seshora de Campanhaã, 0rago principal da Igreja e da freguezia, que tem este mesmo nome na mesma pedra, de que he Imagem milagrosa.
Mas é tudo História e as datas se confundem. Assim como os locais, pois a batalha seria noutro local bem como o achamento da imagem. Que para o caso são só curiosidades.
Tem este pequeno comentário a ver com a Imagem da Senhora de Campanhã. Adiante se verá porquê.
Foto de autor desconhecido, encontrada no blogue Porto Antigo
Foi erigida uma Igreja em local desconhecido provàvelmente entre o séc. IX e X. juntamente, e ou posteriormente, também um mosteiro. Em 1120 desaparece a designação de Mosteiro substitúida pela de Igreja de Santa Maria de Campanhã. Em 1258 é propriedade de um leigo, D. Mendes Extrema, que também possuia a de S. Cosme, agora freguesia de Gondomar, concelho vizinho.
No séc. XV a igreja possuía em edifícios anexos uma albergaria. Por aqui passava um dos troços do antigo caminho romano em direcção a Trás-os-Montes.
A Igreja actual presume-se ter sido construída em 1714 e deve ter ligações à antiga Igreja de Sanctae Mariae de Campanham do séc. XIII
Custa a crer que a foto acima seja a Igreja actual. São bastantes as diferenças, mas na foto não existe legenda. Então quanto ao local nem se fála. Hoje é um espaço vedado, que presumo só servir para nos dias de festa se colocarem as barracas tradiccionais das feiras e romarias. À volta é só mato.
O certo é que há uma imagem em calcário policromado de grande valor, presumindo-se ser do séc. XIV e venerada como a Senhora de Campanhã. Entre lendas e datas de conquistas e da existencia de Igreja ou Igrejas, parece que não há dados concretos.
A Igreja actual possui outras obras de grande valor, destacando-se uma imagem em pedra de Ançã de Nossa Senhora do Rosário, provàvelmente do séc. XIV-XV e outra de Nossa Senhora das Dores do séc. XVII.
Destaca-se também a talha dourada da Tribuna e Altar-mor, do séc. XVIII, embora já com vários restauros. A Igreja foi vandalizada e saqueada em 1809 aquando das invasões francesas e sofreu inúmeros danos aquando da Guerra Civil e do Cerco do Porto entre Julho de 1831-Agosto de 1833.
Está a precisar urgente de novo restauro. Foi encerrada pelos Miguelistas em 5 de Dezembro de de 1832 e reaberta a 18 de Agosto de 1833.
Parte das minhas pesquisas para esta postagem foram recolhidas na Monografia de Campanhã, que inclui variadíssimos itens e locais para novas buscas. Sobre as Águas da Freguesia, destaco o seguinte texto:
Saõ as agoas desta freguezia muytas, e muyto saluriferas, e se tem averiguado, que a da fonte da Igreja e da fonte da Granja, e a da fonte do Gorculhaõ e Coimntomil, são das melhores que ha entre Douro, e Minho, se bem que naõ estaõ com a estimaçaõ que merecem.
Não sei se é esta a Fonte da Igreja que o autor refere (documento publicado pela Universidade do Porto sobre as Águas do Porto no séc. XIX, salvo erro, cujo autor não anotei o nome.
De qualquer maneira, o espaço desta Fonte está encerrado, tem um fio de água a perder-se para um tanque, cheio de ervas ou o que quer que sejam aquelas espécies de flora e o local parece o de uma construção clandestina.
Com as coordenadas definidas vamos então até ao Monte onde se encontra a Capela do Forte. O panorama na sua direcção é visto das traseiras da Igreja de Campanhã, no Largo do Adro.

Tomamos o autocarro 400 para Azevedo, junto à Rotunda do Freixo onde fica em frente a Quinta da Revolta, mais conhecida desde há uns anos largos por Horto do Freixo ou do Moreira da Silva. Mas isso é para outras histórias.
A saída indicada é no Lagarteiro, a penúltima do términos da Linha. Umas placas indicam-nos o caminho, um pouco íngreme, pela Rua do Outeiro do Tine. Desconheço esta toponímia, mas segundo o dicionário "Infopédia", Tine é uma forma do verbo Tinir : emitir sons agudos, tremer com frio, zumbidos. Ou ainda estar sem dinheiro na forma popular "Estou a tinir".
Aqui estiveram acantonadas tropas de D. Miguel aquando do Cerco do Porto. Por isso o Monte é também conhecido como do Forte. A Capela igualmente tomou o seu nome. No entanto é dedicada ao Senhor do Calvário e presume-se tenha sido construída nos finais do séc. XVIII e princípios do séc. XIX. Creio que no último domingo de Junho se realiza a festa do Senhor da Pedra em honra do Senhor do Calvário.
Do alto do Monte podemos apreciar belíssimas vistas sobre o Porto 
Ao fundo, Bonfim e Antas

Da Igreja de Campanhã até às Antas, presumindo-se que aqui tenham existido monumentos funerários megalíticos.
Em grande plano a Quinta de Bonjoia
Lagarteiro e Azevedo são lugares antigos. Azevedo tem a primeira referencia conhecida em 1343 e Lagarteiro (toca ou lura de lagartos) ou Lagarteira (ave de rapina) - curiosamente ainda ontem ouvi este nome em vez de Lagarteiro - já é conhecido na sua forma feminina em 1590.

Descendo o Monte, ou melhor dizendo a rua, ficamos a algumas dezenas de metros do Parque Oriental, inaugurado em meados de 2010, obra do arquitecto Sidónio Pardal. Tinha-o visitado logo após a inauguração e segundo palavras do Presidente da Câmara, essa foi a 1ª fase. A seguir seria a despoluição do Rio Tinto. Pois... palavras leva-as o vento.
Voltamos para trás, percorrendo o Lagarteiro, Azevedo e Meiral descemos até ao lugar de S. Pedro.

Capela de S. Pedro
A sua origem poderá remontar ao séc. XII, altura em que surge referenciada na carta de doação de D. Teresa ao Bispo do Porto D. Hugo uma Eclesia Sancti Petri. Esteve sempre ligada à devoção de Nossa Senhora da Hora, S. Pedro e Bom Jesus Salvador. O actual edifício é uma reconstrução de 1887. Parece que o Altar-mor é uma bela obra em talha e possui valiosas imagens.

Do Adro da Capela, uma vista sobre o Rio Douro, lá ao fundo
A denominação da Rua, Largo, Calçada e Travessa de S. Pedro, em Campanhã, provém da antiga capela desta invocação, desde 1792 orago de uma nova freguesia eclesiástica, a de S. Pedro de Azevedo de Oliveira (totalmente copiado da toponímia da Câmara do Porto).

Depois de matar o bicho, a caminhada estendeu-se até à Granja. Deste lado passa o Rio Torto, ao longo do qual se vão mantendo umas hortas. Campanhã foi desde o seu início uma região fértil, que se estendia e compreendia Rio Tinto e Valbom e não sei se também S. Cosme, tudo hoje pertencendo ao concelho de Gondomar.
A mais antiga referência que existe do Lugar como Aldeia do Monte da Granja é de 1594, num registo paroquial de 1785.
Mas foi a parte sentimental que me levou à Granja.
Sabia que teria existido uma Fábrica de Moagem, onde o meu Pai trabalhou mais de 20 anos. Depois de algumas perguntas, lá localizamos a antiga Fábrica. Que me lembre, apenas fui lá uma vez, numa terça-feira de Carnaval e receber o ordenado do meu pai que tinha sido operado e estava de baixa.
Segundo a história de Família, o ingresso do meu Pai nesta Fábrica foi em grande parte derivado a mim.
Já não é Moagem - desde 1966, se a memória não me atraiçoa - mas foi a primeira na Freguesia, pertencendo desde sempre à Família Paranhos (não a mesma da Quinta do Covelo, em Paranhos) fundada em 1876, com uma máquina a Vapor e empregava 4 operários. Segundo me disseram, ainda  lá se encontram as canalizações do transporte de água.
Como atrás referi, era uma zona fértil, com destaque para o cultivo de cereais, vinho e frutas, que abasteciam a cidade do Porto. Segundo um escrito, «Provê a cidade do Porto» de «muito boas frutas de toda a casta e com especialidade os melões (...).que saõ julgados por nada inferiores no gosto, e grandeza aos celebrados da Vilarissa. Produz boas melancias, grande cópia de bolinas, abóboras brancas e pretas, pepinos, penas, maçãs, ameixas, pêssegos». (copiado tal-qual do original que li).
Julgo que o autor se refere ao famoso e enorme Vale da Vilariça em Trás-os-Montes, que também era muitíssimo fértil e cujos melões eram famosos. Acho que está tudo esquecido, mas presumo que ainda hoje lá se produz algo.
Banhavam e banham este vale de Campanhã os Rios Tinto e Torto.
Nas suas margens existiam grande quantidade de moinhos, alguns dos quais ainda se vêm as suas ruinas.
A indústria veio a seguir já no séc. XIX e com ela veio o aumento populacional e o desenvolvimento.
Mas isso são temas para outros passeios.

Embora tenha colhido alguns elementos na Wikipédia, no site da Câmara do Porto e num ou outro mais, a grande colheita foi na Monografia de Campanhã em http://www.j-f.org/monografia/Default.htm

Foi um prazer ler muitas das dezenas de páginas desta brochura bem como de alguns ficheiros anexos ou fontes de pesquisa.