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sexta-feira, 19 de setembro de 2014

195 - Aveiro

Há pouco tempo, na companhia de bons amigos, antigos camaradas de armas, tive o prazer de revisitar a bela Cidade de Aveiro.
A primeira vez que a visitei muito ao de leve, foi nos princípios dos anos 60 do século passado, num Primeiro de Maio, durante uma confraternização de trabalhadores (como agora se diz) da empresa Artistas Reunidos. O almoço foi no Restaurante Galo d'Ouro. Não sei se ainda existe. Coisas que nunca esquecemos.
Quem chega actualmente a Aveiro por comboio desembarca numa estação nova. Mas tem de reparar forçosamente na velha estação.
Poucos portugueses - e quem sabe, estrangeiros - repararam na revista norte-americana Travel &Leisure uma publicação elegendo a Estação de S. Bento, no Porto, uma das mais bonitas do mundo ferroviário. Creio que a 12ª mais bonita.
Para mim, existem no meu-nosso Portugal estações de caminho de ferro belíssimas. Conheço algumas para falar de "cátedra".

Aveiro possui uma dessas belas estações portuguesas, com cerca de 150 anos. A sua arquitectura é característica das casas portuguesas, revestida de azulejos e grande número de painéis reproduzindo motivos regionais: Paisagens da Ria, Vindimas na Bairrada, o Hotel Palace do Buçaco, trechos da Linha do Vouga, retratos de Pescadores e Tricanas. A maioria são da Fábrica da Fonte Nova de 1916, Fábrica esta que presumo ter sido fundada em 1882 e encerrada em 1937 destruída por um violento incêndio. Mas já há anos que não laborava.

Deixo aqui um apelo à CP, REFER, CÂMARA MUNICIPAL. Ou a quem manda nisto tudo. Não gostei do aspecto desleixado e meio ruinoso da Estação. Não merece este desleixo.

Saindo da Estação e logo no início da actual Avenida Dr. Lourenço Peixinho, deparamos com um belo edifício, que tinha de ser estragado no seu aspecto visual pelo mamarracho que lhe implantaram ao lado.
Belos edifícios não faltam em Aveiro. Mas não vou publicar todos os que fotografei, pois quero que os meus amigos os vejam por si quando visitarem esta linda cidade. Basta estar atento ao que nos rodeia.

O edifício de uma antiga Escola que já foi também a Capitania de Aveiro, as águas do Canal Central passam-lhe por baixo e ao lado. A partir daqui é o Canal do Côjo.

Por muito que bisbilhotemos na net - infelizmente Aveiro está pobremente referenciada e descrita - não posso confirmar se as minhas imagens se referem ao mesmo edifício da foto antiga. Sou um maluquinho por fotos antigas e tento imaginar aquelas épocas comparando-as com a actualidade. Erro ou não, vale a pena olhar o actual Hotel e passar pelas arcadas e ver os seus comércios, olhar os edifícios e o chão. É a calçada chamada portuguesa em toda a sua beleza e que Aveiro nos deixa pisar.

É um saltinho até ao Mercado do Peixe construído em 1938 junto ao Cais dos Botirões. A foto antiga, no canto direito superior, li que é da época anterior à construção do Mercado. No entanto podemos ver a parte superior do Chafariz, cuja data da sua construção desconheço.
Nunca percam, meus amigos, a visita ao Mercado e à  zona envolvente.

Vamos para os canais de Aveiro. Este é o Central. Na minha opinião atravessa a Cidade. Mas tem três toponímias.  Aos poucos lá iremos.
Mas têm de entrar também no Moliceiro para os percorrer. Um custo de 7 € bem empregues.

Eu e os amigos tomamos o Moliceiro no Jardim do Rocio. Local que já não é da Feira de Março. Não visitamos o lado esquerdo, mas do lado direito são dignos de visita os edifícios Arte Nova. Num está instalado o Museu da Cidade e noutro os Serviços de Turismo. Que não tem Guias de informação turística em Português.
Para o caso não interessa nada.

Vou falar (escrever) mais ou menos de memória e nas informações que recebemos do nosso cicerone. Ao fundo do Canal Central, que se chama Canal das Pirâmides, salvo erro, (vai do Jardim do Rocio até à Comporta-Pirâmides) e antigamente ligava directamente à Ria, existem umas comportas. Foram construídas não sei quando para nivelar a água dos Canais, evitando assim uma possível inundação como uma que aconteceu que quási arrasou a cidade baixa.
Na foto direita superior pode-se ver uma das duas pirâmides e um montinho de sal.
Nesta foto, cuja data desconheço, podemos ver o Canal a que chamam das Pirâmides ainda ligado à Ria. Os montinhos brancos são de sal. As Pirâmides presumo que seriam como uma espécie de limite. Não consegui encontrar qualquer referência a elas. Mas li que  o Canal das Pirâmides foi construído no séc. XIX. Apenas isto é o que posso informar.
Se os meus queridos leitores e visualizadores deste espaço, que muito prezo,  repararem, à direita na foto, ao longo do muro, aparece uma espécie de triângulo pintado a branco. É a entrada do Canal de S. Roque. Lá iremos.

Salinas com a cidade em fundo. Que foto excepcional.

Agora vamos entrar no Canal de S. Roque e o nosso Cicerone assinala a passagem com toque num búzio. É como uma espécie de sinal de trânsito. Se é para turista ver e ouvir, não interessa nada.

O Canal de S. Roque teve ao longo das suas margens, salinas, cais de descarga de sal, armazéns, casas de Pescadores e Marenotos e de gentes ligadas ao trabalho na Ria.
Não devemos esquecer que o moliço era uma das riquezas para adubo das terras. E esta gente foi lavradora também. E o moliço era apanhado na Ria e transportado pelos moliceiros.
 Hoje já não há salinas aqui, mas um parque municipal. Ainda há alguns armazéns, as casas foram requalificadas e há restaurantes.
O canal também foi requalificado e é essencialmente uma via turística.
A Ponte dos Namorados, chamada também de Carcavelos , foi uma estrutura em madeira que caiu em 9 de Setembro de 1942 quando estava apinhada de gente para ver uma corrida de bateiras integrada nas Festas de Nossa Senhora das Febres.
Foi reconstruída em betão.

A partir do edifício da antiga Capitania de Aveiro, entramos no Canal do Côjo. Chamou-se antigamente Ribeira das Azenhas devido à quantidade destes engenhos que aqui existiam. 
A indústria Cerâmica na Região é muito antiga. Presume-se iniciada no séc. X antes de Cristo. Depois foram os Celtas-Lusitanos que a continuaram até que vieram os Romanos e a desenvolveram.
No Canal do Côjo existiu uma fábrica cerâmica fundada em 1775, a qual tomou o nome do Canal. Muitas voltas deu a vida e várias fábricas foram fundadas. No final do Canal, apareceu em 1896 a fábrica Jerónimo Pereira Campos e dois filhos. Também um ramal da linha férrea passava por aqui.
As pontes foram alteradas e levantadas para os barcos moliceiros de turismo puderem passar pelo Canal, que também foi alargado para o mesmo efeito.
As margens foram requalificadas e há um novo parque urbano.

 Aveiro viu nascer muitos artistas. Muitos outros estiveram e estão a ela ligados. Vou destacar o Zé Penicheiro que conheci pessoalmente há muitos, muitos anos. Embora nascido em Tábua, a meninice passou-a na Figueira da Foz. Em Aveiro fundou o Círculo de Artes Plásticas O Aveiro/ Arte. Os dois postais-caricaturas são dele. Vejam a sua biografia em http://anexosjopf.blogspot.pt/2012/04/ze-penicheiro.html
Quanto às Tricanas, elas existem (ou exisitiram) nas terras da orla marítima do norte. Senhoras elegantes, com seu xaile negro e porte esbelto. Muitas até seriam de origem humilde, filhas de pescadores e de lavradores que pela sua beleza inflamavam os corações dos homens. Uma ou outra chegou a ser apresentada no Paço Real. Mas que sei eu sobre a Tricana, pois não consegui saber a origem verdadeira ? Quanto muito a tricana seria o vestuário da mulher do litoral que foi evoluindo a partir de 1870.

Algumas recordações tenho de Aveiro, mais pelos seus petiscos. A Sopa do Mar no Centenário era um regalo. E os Ovos Moles humm...
Mas não sendo rigorosamente de Aveiro são da sua região e da Ria que tenho as melhores recordações ligadas sobretudo às pescarias. Uma vezes no Triângulo, que para lá chegar tínhamos de tomar o bote do Mestre Tempestade (ou seria Ventania ? Desde essa altura nunca acertei com o apelido do senhor, que já tinha perto de oitenta anos)  , cuja travessia, ida e vinda custava 10 tostões (1 escudo); e onde apanhávamos os maiores mexilhões que já vi; ora em S. Jacinto, ora na Torreira.

No entanto, as mais célebres eram realizadas a bordo de um moliceiro que alugávamos. Sempre no dia 10 de Junho. A primeira foi feita em 1969 ainda eu não fazia parte deste grupo. Estava longe, noutras terras alagadiças. Em 1970 tive o primeiro convite. O patrão do moliceiro dias depois emigrava para a América. Mas deixou um descente, o Sr. António, que durante uns 4 ou 5 anos foi o nosso mestre. Numa das fotos aparece o filho, uma boa companhia e já um pequeno mestre.

O farnel era imenso, composto de sardinhas e fêveras de porco. As primeiras eram compradas no mercado da Murtosa, logo pela manhã bem cedo. Salgadas no barco, ficavam de estalo. As segundas, iam preparadas de casa pelo mestre Germano Silva. Tudo grelhado no carvão, a bordo. Os garrafões de vinho e as caixas de cervejas eram amarradas ao barco e lançadas na água da ria para refrescar. Não faltava o café feito em cafeteira e coado naqueles sacos que muitos de nós-vós ainda se devem lembrar. E claro o Bagacinho, normalmente ofertado pelo Zé Brito (que a terra lhe seja leve) fabricado nas suas propriedades de Santa Marta de Portuzelo. E ía logo pela goela abaixo de manhãzinha para esquentar. Sim, porque o frio e a humidade da Ria são de arrepiar.
Para o final da tarde estavam reservados uns chouriços assados no dito bagaço, num dos pinhais já a chegar a Espinho.

Embarcávamos no bico da Murtosa. E quando desembarcávamos logo fazíamos a distribuição do pescado. Sarguetas, douradas, enguias, pequenos robalos, um ou outro safio. Caranguejos que apanhávamos com uma rede circular engodado com cabeças de sardinhas eram em quantidades industriais. Só escolhíamos os maiores, o resto voltava para a ria. 
Quando a maré não dava, (para a pescaria) fazíamos passeios pela ria de vela erguida, cujo vento produzia uma velocidade impressionante. Então dava para atracar ao cais da Pousada da Torreira para tomar um café ou uma loirinha.

Vi umas fotos recentes na página da Murtosa do Bico e como aquilo está lindo. 

Gostava de ter o dom de exprimir sucintamente o que é Aveiro e a Ria. Mas isso não é para todos, muito menos para mim. Vejam este pequeno vídeo cujo link vai a seguir

http://videos.sapo.pt/7J7RVS3TtUBkNFdF5ZAj