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domingo, 22 de abril de 2012

125 A - A Praça de Carlos Alberto

Já deixei por aqui neste espaço alguns apontamentos sobre esta Praça. Mas queria terminar com a história dos caminhos antigos - e actuais - que dela partiram, conhecidos como as Estradas da Póvoa e a de Braga.
Quanto à primeira já referi tudo. Resta terminar sobre a segunda.

Tudo começou no Olival, hoje Jardim da Cordoaria, junto às Muralhas Fernandinas e à Porta com o mesmo nome, que seria mais ou menos onde está o antigo Aljube, actual Centro de Fotografia Português. Coloquei-me junto ao edifício da Reitoria da Universidade do Porto, entre os Leões e o Carmo, olhando para a Cordoaria, à esquerda, donde saía um caminho que em Carlos Alberto, à direita, bifurcava. À esquerda para a Póvoa (por Cedofeita, Carvalhido, Monte dos Burgos) e à direita para Braga (por Mártires da Liberdade, Antero de Quental, Amial). Vamos conhecer o início desta antiga Estrada, mas antes gostaria de contar algumas coisas sobre a Praça de Carlos Alberto e o que a rodeia.
A mais remota referência data de um registo paroquial de Santo Ildefonso de 1638. Chamava-se Largo dos Ferradores, porque aqui se aprontavam mulas e cavalos para as viagens longas por aquelas estradas com destino ao Norte Litoral e Minho. Era também um local de Estalagens.
Foi também conhecida como Feira das Caixas, porque numas tendas de marceneiros se faziam Caixas para bagagens que os emigrantes levavam para o Brasil.
Em finais do séc. XIX ou princípios do séc. XX - não consegui elementos que me dessem a data certa -, existiu na Praça um Bebedouro, em ferro fundido, bela peça da Fundição do Bom Sucesso. Tinha a dupla função de dar água e alumiar, pois no seu topo tinha um candeeiro (Luminária, conforme dizem os nossos irmãos brasileiros se não estou em erro). Foi aqui colocado por influência da Sociedade Protectora dos Animais; tem duas taças, uma superior para os cavalos e outra inferior para cães e gatos. Ainda uma torneira para as pessoas. Este bebedouro está reconstruído no Parque dos SMAS, as Águas de Nova Sintra (o Museu ao ar livre de  Chafarizes e Fontes que existiram na Cidade desde o séc. XVII, já referido várias vezes) e onde colhi a sua história.
Mas aqui vêm as minhas dúvidas. A foto da esquerda de Arnaldo Soares (ou uma sua edição) tem a legenda Bebedouro de Carlos Alberto. Ora a foto parece-me que foi obtida na antiga Feira do Pão na Praça de Santa Teresa, hoje de Guilherme Gomes Fernandes. Vêm-se por detrás as barraquinhas da venda do pão. Estarei enganado ? A foto do meio é sem dúvida na Praça de Carlos Alberto. A da direita é o Bebedouro reconstruído no Parque dos SMAS. Curioso que todos os Bebedouros têm aspecto diferente. Pormenores, sem importância, mas curiosos.
Mas vamos à Praça em si mesma.

À direita, a Casa dos Moreira do Couto, do séc. XVIII, com brasão de armas da família. Provàvelmente mandada erigir pelo Dr. Bartolomeu Moreira do Couto, advogado da Relação do Porto e oficial da Inquisição do Santo Ofício. Bom rapaz, com certeza...
A Inquisição foi criada em 1184 no Sul de França e em Portugal existiu de 1536 a 1821.

Do lado esquerdo a Igreja da Irmandade do Carmo, construída entre 1756 e 1768. A monumental fachada lateral em azulejos datados de 1912, representam cenas alusivas à fundação da Ordem Carmelita e ao Monte Carmelo, desenhados por Silvestre Silvestri, pintados por Carlos Branco e executados na fábrica da Torrinha, em Gaia.

No mesmo correr, o Hospital da Irmandade, concluído em 1801.
Ao nível do passeio, encontram-se algumas lojas com fachadas do início do séc. XX.
Os edifícios desta Praça estavam em ruínas - alguns ainda estão - mas entre 2001 e 2010 a zona foi reabilitada. Com intenção de trazer moradores para a baixa. Com preços exorbitantes só lhe devem ter pegado alguns escritórios de advogados. Penso eu de que...
Contràriamente ao que sucedeu na Praça da Liberdade e Avenida dos Aliados, destruídas pela dupla magnífica Rui Rio/Siza Vieira, esta Praça manteve mais ou menos o seu aspecto. Embora houvesse um homenzinho que também a tentou destruir. Não sei quem foi a alma caridosa que o não permitiu.
Foi da Varanda do Café Luso que Humberto Delgado em 14 de Maio de 1958 disse à multidão "O meu coração ficará no Porto ". Neste emblemático café, agora remodelado, ficou instalada a sua sede de campanha à Presidência da República.
Nele também nasceu em 1980 o Fantasporto, que acabou há dias de completar mais uma edição.

No centro do jardim, um monumento da autoria de Henrique Moreira, relembra os portugueses mortos na Grande Guerra de 1914-18. Esta foi a segunda escolha do monumento, pois o primeiro, de um outro escultor não foi do agrado dos portuenses.

No topo Norte e de costas para o Palacete dos Viscondes de Balsemão, uma homenagem a Humberto Delgado, monumento da autoria do escultor José Rodrigues inaugurado a 14 de Maio de 2008.
O Quiosque da Ramadinha, inicialmente instalado no Largo de Santo André (1930), actual Praça dos Poveiros, foi posteriormente transferido para o Largo da Ramadinha, ali bem próximo (1948). Actualmente colocado na Praça de Carlos Alberto (2005), o quiosque é uma réplica do original, mandado construir pela Câmara Municipal do Porto.

Quási a chegar à Rua das Oliveiras, o famoso "chaço" de Carlos Alberto, agora também com casa de compra de ouro no rés-do-chão. Com Polícia à porta. As instalações provisórias (para os interessados) funcionam um pouco a baixo enquanto o edifício está em reconstrução.
Foi nesta casa de penhores que comprei a minha primeira máquina fotográfica: uma Halina-flex com lente 3/.5.8 zeiss, 6x6. Custou 600 escudos, o equivalente a uns míseros 3 euritos de agora. Bom, isso foi em 1963 e acompanhou-me até Julho de 1968. Regressou a Portugal, vinda da Guiné, na caixa com os pertences do seu último dono, que por sua vez veio (ou obrigatòriamente deveria ter vindo) num caixão chumbado.

Junto ao Palacete dos Viscondes de Balsemão, cuja história conto no escrito nº 24, uma foto em fim de tarde chuvosa, de início de Primavera.
Vamos entrar, então, no início da antiga Estrada de Braga ou Guimarães, como queiram, mas no fundo, do Minho, agora chamada Rua das Oliveiras.

Antigamente chamada de Viela dos Ferradores, já era conhecida em 1761. Fazia parte do Bairro do Laranjal, extenso, desde a actual Praça da Liberdade/Avenida dos Aliados/Praça General Humberto Delgado e também do Olival do Bispo (desde a Cordoaria actual). O edifício em ruínas, à direita, albergou no rez-do-chão uma loja de recepção de encomendas da antiga Empresa Geral de Transportes, onde despachei tantas encomendas em cima e para lá da hora. Gente boa, esses trabalhadores do antigamente.

À esquerda encontra-se o Teatro Carlos Alberto, construído na horta que pertenceu ao Palacete dos Viscondes de Balsemão.  Inaugurado em 14 de Outubro de 1897, por iniciativa de Manuel da Silva Neves,  foi desde o início um espaço vocacionado para a apresentação de espectáculos de cariz popular: do “circo de cavalinhos” às operetas, do teatro ligeiro ao cinema.
No meu tempo de adolescente ainda novito, passava sessões à tarde com 2 filmes, normalmente um de amor (ah que saudades da Libertad Lamarque e de História de um Amor de 1956) e uma coboiada.  
Os porcos da minha Cidade não gostam de ver paredes limpas. Mas isso são outras histórias.
Passou por várias fases desde 1974 e hoje está ligado ao Teatro Nacional S. João. Foi aqui que as primeiras edições do Fantasporto passaram.
Num edifício com cerca de 150 anos, recuperado, quási em frente, está instalado um moderno Hostel.
No entroncamento com a Rua da Conceição, encontramos um edifício também recuperado e onde funcionavam uma pensão de escada no primeiro andar (e que depois de 1975 albergou refugiados da África colonial) e no rez-do-chão uma velha confeitaria-café. Hoje está lá uma outra. Em frente era a Casa dos Plásticos e mais abaixo um velho barbeiro que ainda existe. Provàvelmente com outros artistas.
E assim chegamos ao fim da aventura de umas (entre tantas) ruas-estradas que durante séculos foram saídas da Cidade.
Naveguei por estas Ruas do fim para o princípio. Mas não houve planeamento. E assim vou descobrindo a minha Cidade e tentando dá-la a conhecer. O que diga-se de passagem é uma coisa óptima.