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sexta-feira, 14 de setembro de 2012

140 - O Nosso Douro Lindo

Velhos amigos combinaram fazer um almoço fora do ambiente tradicional da nossa Cidade do Porto e aproveitando os descontos que ainda a terceira idade usufrui na CP, escolheram a Régua como destino.
Em Campanhã esperámos o comboio e na linha onde devia parar vindo de S. Bento, o painel informativo não informava nada sobre ele mas sim sobre um sem paragem. Pensámos que seria um comboio para a recolha. A hora estava a aproximar-se e a informação continuava. Chegou um comboio que parou. Como levava passageiros, entramos. Não havia dúvidas, era o nosso. E a informação lá continuou no painel.
Preparamo-nos para a viagem e olhar o que a natureza tem para nós guardada.

Mesmo com os vidros sujos das janelas, não se pode deixar de colher algumas imagens. Para o Peixoto eram apenas campos.

O Rio Tâmega vindo desde a Galega Ourense, depois de fertilizar a belíssima Veiga de Chaves, lança-se em direcção a Entre-os-Rios onde vai abraçar o Douro.

Depois do Marco de Canavezes, entra-se no troço do Juncal ligando à Régua, concluído em 1879. Passado o túnel, o comboio chega-se ao Rio Douro e em cada volta do caminho, uma surpresa.

É difícil controlar o ímpeto e não deixar de fazer mais um boneco.

A Estação de Aregos, ou de Caldas de Aregos, tomou o nome de Tormes inventada por Eça de Queiróz na Cidade e as Serras, onde o Jacinto e o Zé Fernandes desembarcaram, vindos da Boémia Paris, atravessando a Espanha onde as malas se perderam no transbordo. Era a referência à Linha Ferroviária do Douro Internacional. Aos amigos interessados, posso ofertar via net, esta obra magnífica, que o autor já não foi a tempo de corrigir totalmente, levado cedo pela morte. É editado o livro em 1901, postumamente. Aqui é Santa Cruz do Douro onde está sepultado. (Eça de Queiróz - Póvoa de Varzim, 25.Nov.1845 / Paris, 16.Agosto.1900)  
Nesta Estação desembarcava quem ia para as famosas e antiquíssimas Termas, do outro lado do Rio cujas águas medicinais a 60º já eram bem conhecidas dos Romanos. Consta-se que foi aqui que D. Afonso Henriques curou a sua perna e a Rainha sua Esposa mandou construir um lazareto.
Eram barqueiros que faziam a travessia, em barcos a remos, de pessoas e bens. Hoje é uma lancha que o faz e as Termas são um belíssimo complexo turístico.

Desta vez o horário foi cumprido e também vinha bem composto de passageiros, principalmente estrangeiros. A senhora dos Rebuçados da Régua no seu posto de trabalho, tradição vinda dos anos quarenta do século passado. Também já foram vendidos no Porto, logo à saída da Estação de S. Bento. Uma delícia estes rebuçados, cuja paladar varia conforme o segredo do fabricante perante os "pósinhos" que lhes adiciona. Uma saqueta com 9 custam apenas 1 euro. Mas cada rebuçado, chupado nas calmas, dá para 10 minutos...

Há dois meses, o largo da Estação estava numa confusão tremenda de obras. Hoje, a confusão continua, mas não vi uma única pessoa a trabalhar e as máquinas lá estacionadas.

O nosso camarada Fernando Súcio esperava-nos. Entretanto havíamos pensado almoçar em qualquer lado e combinamos uma passeio ao Pinhão só a duas dezenas de quilómetros. O Fernando puxou pela carola, enfiou pela velha ponte e já estávamos no concelho de Lamego.
Ligando as duas margens existem 3 pontes, mas estas duas são as que interessam para o caso. A de arcos de ferro, à esquerda, foi construída em 1872 e veio substituir o transporte de pessoas e bens em barcaças entre as margens. Foi ou ainda está a ser recuperada para uso pedonal e de bicicletas. A de pedra é da 2ª vintena do séc. XX. e pensada para trazer o comboio para este lado, vindo da Régua e até Lamego, mas deu em nada o projecto. Passou a ponte rodoviária tendo-se desactivada a de ferro.


Estamos do lado que pertence a Lamego, isto é, na margem esquerda do Douro e por aí vamos seguir até ao Pinhão, para leste. A meia dúzia de quilómetros encontramos a barragem de Bagaúste, finalizada em 1973.


Quis o tempo atrasar as vindimas por todo o País, mas prometendo um ano muito bom. Assim seja. Beber vinho é dar de comer a um milhão de Portugueses, já dizia Salazar. E a maioria dos acidentes rodoviários não é por causa do Vinho Português. Ao longo da estreita estrada, à distância de um braço, as cêpas estão lindas, esperando para breve as mãos que vão colher o seu fruto.
Passaram por nós, apressados, porque é o seu trabalho e nós apenas turistas a parar a todo o momento, carrinhas carregadas com uva branca, essas já no ponto próprio que os especialistas determinaram poderem ser vindimadas.

A foz do Rio Távora, vindo de mais de 50 quilómetros desde Trancoso até junto a Tabuaço ajuda a engrossar o Douro. Está escrito que neste local, no Inverno formavam-se os piores rápidos desde Barca D'Alva até à Régua. Um sorvedouro de Rabelos e Homens.
Passar a repetir-me é o que pode mesmo acontecer. O nosso pára-arranca foi maior do que andar de carro numa cidade desorientada.
As pequenas estradas foram construídas entre os Morros e o Rio, desde há uns anos domado pelas inúmeras barragens que lhe foram construindo no seu percurso. Os Morros, desde tempos suevos e aprimorados pelos romanos, foram uma herança que os naturais souberam aproveitar e ainda mais desenvolver, construindo os seus socalcos em xisto segurando-os com oliveiras e no seu meio meteram-lhe cepas de variadíssimas qualidades, afrontando as pragas que periòdicamente as vinham dizimar, mas juntamente com o clima conseguiram produzir não só vinhos de excelente qualidade mas também azeite e frutas diversas.
Para dentro de cada um rezamos esperando ver um comboio do outro lado. Orações ouvidas e aí ainda mal se descortinava lá ao longe, em uníssono gritamos: Olha o comboiooooo. Paragem obrigatória para captar todas as fotos que nos aprouve. Agradecemos ao deuses, o dos comboios pelo horário; ao do Douro, por podermos olhar mais uma maravilha.
E aí está o Pinhão. Foi só atravessar o Douro para a margem direita e a primeira paragem, debaixo de uma temperatura escaldante, obrigatoriamente tinha de ser para visitar a belíssima Estação Ferroviária, ex-libris da região do Alto Douro Vinhateiro, que viu chegar o primeiro comboio no dia 1 de Junho de 1880.
Os seus magníficos 25 painéis em azulejo da Fábrica Aleluia, de Aveiro, encomendados em 1937, em tons de azul, representam cenas culturais e históricas da faina duriense. Na sala de espera, algumas relíquias dos velhos tempos. E o relógio, esqueci de ver o fabricante (alô amigos, por acaso repararam no pormenor ?), funciona mesmo.

A barriga já estava a dar horas, afinal tinhamo-nos levantado de madrugada, mas uma foto para o nosso Museu Particular das Memórias era superior a todas as vontades.
A primeira porta que batemos tinha bom aspecto, pequenina e com comensais a dar ao dente, mas haviam duas mesas vagas à nossa medida. Como sempre o sentar foi de difícil escolha. O prato do dia, devidamente espreitado para o de um dos comensais, eram Tripas à Moda da Casa. E recolheu a unanimidade.
Embora houvesse Bacalhau e não tive dúvidas sobre a qualidade quando o vi na mesa ao lado, onde dois casais entradotes na idade, camones de origem, desgostavam o bicho; confirmou-se quando a camareira lhes foi perguntar se estava tudo bem e reparei no ar de uma das senhoras, enfartada, expelindo um grande bbfffuuu à mistura. E mais de um lombo da altura da mão travessa, na travessa sobrando.
Haviam na carta, Lombo de Porco, Vitela, Cabrito, ambos confeccionados assados. Mas eram as Tripas e mai'nada. Para aperitivar, queijnhos frescos, presunto fatiado à mão, melão, azeitonas pequenas brancas, curtidas, uma delícia. A sobremesa o tradicional semi-frio, só uma dose como é habitual para o único não doente do grupo, que provei. Vinho tinto muito, da casa, duriense pois claro, de paladar muito simpático, ligeiramente arrefecido. Cafés e Bagaço(s) do patrão, feito de vinho generoso.
No final uma agradável surpresa. Tudo por menos de 38 euros. O que me levou a perguntar se não havia engano. Como a factura se lia mal, quiseram-me descriminar a conta, escrita a tinta. Até compreenderem que me queria referir se o erro estaria contra eles, demorou um pouquinho. Mas estava tudo bem. Cumprimentei o chefe, calculo que esposa e filha em idade escolar, e a Linda Mineira que nos serviu com uma gentileza muito grande.
A casa fica mesmo em frente à estação, ligeiramente descaída para a direita para quem está de costas. Um aviso, mesmo para os que não são benfiquistas: podem entrar à vontade porque qualidade, preços em conta e simpatia não faltam neste Motivo.
Andar um pouquinho fez bem. Lá no alto preparam-se terrenos para novos plantios.

Algum artesanato à venda em vários locais a preços convidativos.

A Estação vista da gare.

Há que voltar à estrada e ver o Rio Pinhão desaguando. Da entrada de uma Quinta, avista-se o monte da Quinta das Carvalhas, uma das mais famosas da região, com a sua casa lá no alto para turista ver e usufruir a belos preços.
As paragens continuaram e há coincidências interessantes.

Sobranceira ao Rio Pinhão, com uma vista fabulosa, existe uma casa onde entramos para fazer perguntas. Conversa aberta e o senhor Tigelas apresenta-se. Barbeiro e Tasqueiro de profissão, tem sido muito requisitado para reportagens. Mostrou-nos a última, da Visão da semana passada com histórias sobre o Douro (publiquei-a no meu espaço do facebook) mas também lá tem um recorte do Jornal de Notícias, feita há uns tempos atrás. Entre palavras, oferece-nos um Bagaço do Patrão. Quis comprar um garrafão mas disse que só tinha pouco mais de meio litro. Nem sempre a vida nos sorri...
A Ponte e o Rio Pinhão visto das traseiras da sua casa que nos abriu totalmente.

Passada a Ponte, um saltinho até mais acima para espreitar o que se passa.

É a foz do Rio e a Ponte Ferroviária.

Pés ao caminho e no sobe e desce, o amigo Teixeira lembrou-se que tinha um amigo por ali a quem quis visitar. O amigo Correia não estava em casa, mas neste mundo nada se perde. E é um outro Douro sem o Rio que encontramos.

E até umas nuvens lindas apareceram no céu azul, deixando sombras nos montes.
Agora as paragens são menos frequentes, já olhamos para o relógio a pensar na Régua e no comboio das 17h14m. Mas Alijó e Favaios são por aqui e estas terras num planalto grandioso a 500/600 metros de altitude pertencem-lhes. Favaios, segundo historiadores, deve o seu nome latino a Flavius, uma antiga povoação romana de Panoias, Vila Real.
Famosíssimo e Internacional é o vinho moscatel que a Adega Cooperativa produz, um excelente aperitivo. Mas também se produzem Vinhos de Mesa, Porto e Espumantes.

Estamos na Régua ainda a tempo para uma loirinha no bar da Estação e comprar os Rebuçados. O Fernando Súcio é uma máquina de controle perfeito.
Ficamos admirados com a quantidade de passageiros. O comboio estava atrelar máquinas e vagões.
As carruagens apresentavam este aspecto magnífico e a composição ficou enorme.

No interior não havia lugares sentados para todos os passageiros. Presumimos por conversas telefónicas que ouvimos a um funcionário e outras trocadas com agentes de turismo, que a CP é uma empresa relaxada, não ligando às reservas que lhe são feitas com antecedência, não cuidando dos interesses nacional-turísticos, um filão que poucos compreendem ou talvez não tenham mesmo interesse em compreendê-los. E assim vai Portugal...

Regressados ao Porto e a Campanhã, depois de um dia escaldante mas belíssimo, cheios de sede, não demorou nada para no Metro duas loirinhas tomarmos e comer uma fatia de bola de carnes para encher.

Desculpem, caros amigos, pelo grafismo péssimo da página. Já estou farto de tentar arrumar e não consigo arrumar nada. Portanto fica assim mesmo.
E não esqueçam de vir ao Douro. Ele é enorme e tem maravilhas para todos os gostos.