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segunda-feira, 21 de março de 2011

67 - Do Hotel do Louvre a Metralhadoras 3

Uma promessa feita ao meu camarigo Vasco da Gama, levou-me à Rua do Rosário para lhe "mostrar" a casa onde viveu nos seus tempos de estudante. E aproveitando a pedalada, dei uma "volta ao quarteirão.Comecemos por referir que a rua tomou o nome do tio de Almeida Garrett, Domingos do Rosário, aqui foi morador e proprietário tendo provavelmente doado uns terrenos para a abertura da rua. Na esquina com D. Manuel II fica o degradado edifício do antigo Hotel do Louvre. Já referido em notas anteriores, mas nunca é demais falar dele. Faz precisamente este mês 139 anos que D. Pedro II do Brasil aqui se hospedou. Albergou o Cine Clube do Porto, a Sede do velhinho Salgueiros, o Orfeão Lusitano, a sede do MUD assaltada pela Pide em 1948, o Clube de Campismo do Porto. Uma pena a situação em que se encontra e logo numa zona altamente visitada.

Quási no início encontra-se o palacete que foi dos Albuquerques - desconheço quem teriam sido -também doadores de uns terrenos na zona. Hoje é um centro comercial, bem conservado.
Em frente encontra-se uma verdadeira obra de arte de arquitectura. Na minha opinião, claro.
A par de construções recentes, vêm-se obras arquitectónicas de outrora onde a pedra, o ferro forjado e o azulejo imperam. Cumprindo a promessa, cá está o 150 de cama, mesa e roupa lavada, do camarigo Vasco. O prédio está bem conservado e quem disse o contrário enganou-te.
Vizinhos próximos são o novo Hotel Das Arts...
... e a Escola de Comércio do Porto. cuja fachada em azulejo é espectacular.
Para os saudosos e principalmente para quem trabalhou na Têxtil, relembro o edifício da famosa Caixa da Têxtil, na esquina de Miguel Bombarda, onde outro camarigo, o David Guimarães, passou parte da sua vida.
Olhando para trás, bem ao fundo, vemos uma das colinas de Vila Nova de Gaia.
Voltando à esquerda, ou por Miguel Bombarda ou pelo Breyner, vamos dar à Maternidade Júlio Dinis. No Largo com o seu nome, que já foi Largo dos Ingleses e do Campo Pequeno, o Chafariz de 1894. Foi território Inglês, incluindo Cemitério e Igreja. Os terrenos foram litigados com a Colegiada de S. Martinho de Cedofeita. A Maternidade Júlio Dinis foi construída de raiz por Saul Domingos Esteves sendo o risco do arquitecto francês George Epiaux, em terrenos que pertenciam a Alfredo Castro vendidos ao Estado. Foi seu impulsionador o Dr. Alfredo Magalhães. Inaugurada em 1939 esteve dependente da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Desde essa data sofreu várias alterações, reformas e aumentos, tendo por isso os seus jardins, que eram magníficos, sido diminuídos na sua superfície. Por fim, também recordo este Hospital onde nasci - por isso sou de Massarelos - e fui operado duas vezes. Logo, sinto um carinho especial por esta casa. O seu sítio http://www.mjd.min-saude.pt/Frame.htm é um dos mais perfeitos e completos que conheço. Desconhece-se a origem desta Fonte, mas presume-se ser do séc. XVIII e terá pertencido ao primitivo dono dos terrenos, um súbdito o inglês. Transito difícil pela Rua da Maternidade. Não esqueci o antigo Conservatório de Música, mesmo pegado aos espaços da Maternidade. Terá direito a uma crónica especial.
Esqueçamos os ingleses que foram donos deste pedaço e siga-se pela Rua do Pombal, que afinal já não o é, pois agora chama-se Adolfo Casais Monteiro. Não sei a origem da designação antiga mas a da actual refere a C.M.P. que é uma homenagem ao escritor e professor universitário. Nasceu no Porto em 4 de Julho de 1908 e morreu em S. Paulo em 23 de Julho de 1972.

Não tinha programada a volta a este quarteirão. Mas como o caminho se faz caminhando, lembrei-me de ter lido em tempos no http://www.portoantigo.org/2010/01/o-velodromo-maria-amelia.html que por aqui existiu um velódromo. E fui tentar procurá-lo. Vi uma senhora à janela, já entradota na idade e perguntei-lhe se o conhecia. Expliquei-lhe que era um local onde a rapaziada de há 100 anos, talvez menos, andava de bicicleta. Olha, diz-me ela, no meu tempo foi no Palácio (ali a dois passos) que aprendi e andava de bicicleta. Recuei uns anos e também me vi por lá a dar ao pedal. Quási toda a estrutura do Velódromo continua lá. Foi-lhe dado o nome de D. Amélia em homenagem à Rainha, esposa de D. Carlos, a quem os terrenos pertenciam e que os doou ao Velo Clube do Porto. Ou terá sido Real Velo Clube ? Para o caso não interessa nada. Claro que não o vi, pois faz parte dos jardins fechados do Museu Nacional Soares dos Reis. Foi inaugurado em 1895 mas a história do ciclismo português está ligado a ele, até porque o primeiro clube de ciclismo nasceu no Porto.


Esta era a entrada para o Velódromo. Nada a refere, mas não tenho dúvidas, pois é a única abertura para as traseiras do Museu.
Por casualidade (?), no muro que se projecta até à Rua D. Manuel II, existem estes nichos, milagrosamente formatados para cartazes de publicidade. Serviriam antigamente para o mesmo efeito, por exemplo, anunciando as corridas ?
O velódromo. A foto "saquei-a" do blogue Porto Antigo, atrás referido.
Para completar a volta ao quarteirão, entramos na Rua D. Manuel II, cujo Palácio das Carrancas, hoje Museu Nacional Soares dos Reis se destaca do lado esquerdo.

Este edifício começou a ser construído em finais do séc. XVIII para residência e fábrica de ourivesaria dos Carrancas, apelido de uma família abastada cá do burgo, os Morais e Castro. Foi quartel general de Soult aquando das invasões francesas e depois de Wellington após a expulsão dos saqueadores. Durante as Lutas Liberais foi local de acolhimento de D. Pedro IV; adquirido aos descendestes da família em 1861, por D. Pedro V por 300 contos de réis para residência real durante as suas visitas ao Porto. Li que D. Manuel II ainda o utilizou numa das raras visitas ao Porto, já exiliado. Daí o nome da Rua em sua homenagem.Passou a chamar-se Paço Real. Após a instauração da República e porque o Paço Real era propriedade privada do rei, esteve encerrado até 1932 data do falecimento de D. Manuel II. Este legou-o à Santa Casa da Misericórdia do Porto. Passou para o Estado em 1939 para aí instalar o espólio do Museu Municipal do Porto e do ex-Museu Portuense de Pinturas e Estampas, fundado em 1833 onde tinha nascido o primeiro museu de arte em Portugal. A foto é de Arnaldo Soares do princípio do séc. XX


Do outro lado da Rua D. Manuel II, um monumental edifício cheio de história.Em 1838, poucos anos após o levantamento do cerco miguelista (1829/1932), a Câmara do Porto evoca a vitória liberal determinando que a Rua dos Quartéis, - já tinha tido outros nomes e hoje de D. Manuel II - passasse a ostentar a designação de Rua do Triunfo. Aqui existiam desde o séc. XVII - presume-se que o seja apenas por causa do portão de entrada - um conjunto de edifícios destinados a aquartelamento militar. O governo Miguelista estabeleceu aqui o R.I.9 passando posteriormente para o antigo R.I.6. Há quem escreva que só existiu o R.I.6. Mas também não sei quem, quando e como foi recuperado o edifício actual, na medida em que dos antigos pouco sobreviveu. Actualmente o edifício alberga serviços do Hospital de Santo António.

É já no séc. XX que passa para Metralhadoras 3 e posteriormente, nos anos 60, derivado à Guerra do Ultramar, passa a albergar o CICA 3, se não estou em erro. O emblema primitivo continua gravado no granito.A seguir ao Quartel, eram os terrenos do primitivo Horto das Virtudes, fornecedores reais, que se estendiam, desde meados do séc. XIX, até Miragaia. Para a abertura de novas ruas, foi sendo retalhado. Posteriormente passou para o Moreira da Silva, de Campanhã. A fachada em vidro era enorme e junto à entrada, ostentava uma pera gigante gravada na pedra. Desse Horto, resta para o portuense visitar, o bonito Jardim das Virtudes que vai desde as traseiras da Cooperativa Árvore até um magnífico miradouro sobre Miragaia. A não perder uma visita.



Finalmente, paz e sossego no Jardim do Carregal. Mas isso fica para outra vez.

Os textos, principalmente os históricos foram pesquisados em vários sítios, alguns referidos. Mas não se pode esquecer o http://www.portoxxi.com/ .

Uma curiosidade sobre a Rua D. Manuel II. Logo após o 25 de Abril de 1974, foi proposto na reunião camarária que a Rua mudasse o seu nome para Estaline. Chumbada a proposta, energúmenos resolveram pichar as placas da Rua com o nome do ditador soviético.


7 comentários:

  1. Se eu já não necessito que me abanem muito para me saltar uma lágrima, com estes miminhos do Jorge Portojo estou todo derretido.

    Tantas e tantas alegrias que eu passei na rua do Rosário nº 150...foram os melhores anos da minha vida, embora sobre a nossa geração pairasse o pesadelo da guerra colonial.

    Reconheço todos os nomes que referes no teu trabalho e vi com outros olhos pormenores e minúcias que só mestre Portojo é capaz de referir.

    Mas, como aluno atrevido e reguila que sou, ousarei apontar ao mestre falta imperdoável, pois não refere, nem ao de leve, as tascas da rua do Rosário.

    Mesmo em frente a minha casa situava-se o Freitas, casa pouco concorrida pois o dono tinha pouca paciência, e ao fundo da rua havia duas tascas sempre cheias de malta.

    Á esquerda o sr. Domingos careca, sempre a ralhar com o filho e com amulher, mas tinha um vinho da Meda que fazia um sucesso, mas que ás vezes obrigava a sestas prolongadas, com falhas às aulas, mas recuperávamos a tempo de ir ao cinema, normalmente ao Carlos Alberto, com sessão dupla e barulheira infernal quando havia coboiadas.

    Do outro lado da rua era o famoso Zé dos Bragas, onde eu aboletava mais amiúde, pois a cozinha era mais variada e o barulho não era tanto. Esteve à frente do estabelecimento um senhor que tinha vindo do Brasil, o sr. Avelino.

    Uma das empregadas era a Laura e a outra a Glória.
    Dava-lhes cabo da paciência, pois quando havia frango era certo e sabido que eu pedia: " por favor serve-me pito "!
    Um dia um camarada meu Jorge Paiva de seu nome, pediu "frango à minha moda"(pito) a uma delas, que de imediato foi fazer queixa ao sr.Avelino. O homem mandou o Paiva para a rua e quando ele se desculpou comigo, pois era assim que pedia o repasto ouviu a resposta:

    Mas o Vasquinho pode dizer e o senhor é um mal educado...

    Aqui bebia uma garrafa de Campelo, "fresquinho dá gosto bebê-lo"! Lembram-se?

    Temos que nos encontrar para te contar uma história da rua do Rosário, quando a rua ainda tinha os trilhos do eléctico.

    Obrigado Jorge por estaes momento e desculpa lá se embalei....

    Um abraço amigo

    Vasco Augusto Rodrigues da Gama

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  2. Caro Vasco
    O teu comentário passaria a post se tivesse fotos das casas que já não existem.
    Pelo menos não as encontrei e sabes como sou bom olheiro para essas coisas.
    Algumas Residenciais e cafés-botecos é o que se vê agora e onde normalmente nem o bagaço é razoável.
    Não se pode ter tudo, meu amigo.
    Um abraço
    Lamento, caro amigo

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  3. Realmente eu não conheço nada disto..
    fico maluca..quando vejo isto tudo..
    pois vivi no Porto alguns anos, bem não sei quantos, mas nada..
    se calhar até por lá passava em algumas dessas ruas, mas nessa altura não ligava ao nome delas.
    Acredita que admiro muito ..mesmo muito os teus trabalhos referentes à cidade
    do Porto e também admiro muito a tua capacidade e paciencia que tens
    para que tudo se apresente impecável em todos sentidos...
    LM

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  4. Jorge

    Gostei dos complementos do Vasco da Gama ao teu Post.
    Recordo as Casas, mas, efectivamente nem sei quando acabaram as suas "vidas".
    Na verdade, seria uma falha grave se te cheirasse a petisco e não fizesses qualquer referência!
    Tudo muito certinho e documentado como mandam as regras do bom Cicerone que, inegavelmente, és.

    Abraços, do
    Santos Oliveira

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  5. Pois é Camarigo Vasco,já não há Freitas, já não há Domingos, já não há morfes, já não há pinga, já não há nada como antigamente.
    Porque se houvesse e com qualidade o nosso "OLHEIRO" Jorge Portojo já tinha referido os nomes, pois a ele não lhe escapa nada.
    Um grande abraço para todos.
    Adriano Moreira

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  6. Eu, ali para a rua do Rosário, basta-me fechar os olhos e vêr as tascas e as pessoas dos anos 40 a andarem de um lado para o outro e tenho a certeza que não me escapa nenhum pormenor, nem rosto.Que saudades...! Nasci ao fundo da rua da Torrinha, na Padre Cruz...
    Bem hajam, amigos.
    Armando sousa

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  7. Já estive no velódromo quando visitei o MNSR, no espaço deste tem uma colecção de brasões...

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